Equador: "Depois de muito sofrimento, triunfou a democracia", celebra dirigente correísta

Em entrevista à Fórum, o deputado Pabel Muñoz comparou a perseguição contra a Revolução Cidadã com a prisão do ex-presidente Lula e afirmou que uma vitória de Andrés Arauz no segundo turno é "totalmente factível"

Pabel Muñoz | Foto: Assembleia Nacional
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Depois de quase quatro anos de uma perseguição eleitoral intensa, o movimento da Revolução Cidadã (RC) conseguiu participar das eleições e colocar em primeiro lugar seu candidato, o economista Andrés Arauz, de 35 anos, da União Pela Esperança (Unes). Ex-ministro do ex-presidente Rafael Corrêa, Arauz conseguiu cerca de um terço dos votos (32,6%) no primeiro turno e busca confirmar a vantagem no segundo.

Em entrevista exclusiva à Fórum, o deputado reeleito Pabel Muñoz, dirigente correísta e ex-ministro do Planejamento, afirmou que o resultado das urnas representa um triunfo da Revolução Cidadã. No último período, ele atuou como coordenador da bancada da RC na Assembleia Nacional.

"A votação foi claramente em um sentido progressista, com Andrés Arauz, depois de quatro anos de total perseguição e injeção de ódio na sociedade. Nós somos os vencedores desse primeiro turno sem dúvida alguma. Essa vitória está cheia de emoção e responsabilidade. Para nós, inclusive, o direito de participar já era uma vitória", declarou.

"Depois de muito sofrimento, a sociedade equatoriana pôde festejar o triunfo da democracia. A possibilidade de termos democracia sempre será motivo de satisfação. Havia um risco da sociedade não ter podido celebrar a democracia", disse ainda.

Muñoz citou um editorial publicado no portal Nodal para apontar que havia um risco de acontecer no Equador o mesmo que aconteceu na Bolívia. Essa era a mesma visão da governadora Paola Pabón, quando conversou com o Fórum América Latina às vésperas do pleito.

"O plano estava em marcha. Até o dia 11 pensei que o processo eleitoral não seria celebrado", apontou Muñoz.

Ele também crê que Andréz Arauz sairá vitorioso em 11 de abril. "Acredito sim que será possível essa vitória., é totalmente factível", sustentou.

Primeiro turno

Questionado sobre o fato da vitória não ter sido garantida em primeiro turno, Muñoz afirmou que esse nunca foi o objetivo principal do movimento e que o resultado tal como foi apresentado já foi bastante celebrado. Ele comparou a situação do movimento da Revolução Cidadã com a prisão do ex-presidente Lula e o golpe contra o Evo Morales na Bolívia.

"Nós tínhamos probabilidades de vencer em primeiro turno, mas não era esse o nosso objetivo tático. A perseguição com a Revolução Cidadã foi brutal. Acredito que nossa perseguição está próxima do que ocorreu no Brasil e na Bolívia. Na Bolívia, quando Evo Morales venceu, roubaram a eleição com ajuda da OEA. No Brasil, quando o PT tinha possibilidades de ganhar com Lula, tiveram que prendê-lo. Aqui no Equador, a perseguição judicial, administrativa, midiática esteve junto da perseguição eleitoral. Queriam impedir a nossa participação. Nossos objetivos eram participar com candidatos em todo o país e terminar em primeiro na primeira volta", declarou.

"O 'plus' seria ganhar em primeiro turno. Sabíamos que tinha probabilidade, mas esse sempre foi visto como um 'plus'. Estamos absolutamente felizes de termos ganhado em primeiro turno", completou.

Segundo turno

Diante da indefinição sobre qual será o candidato que enfrentará Arauz no segundo turno - o banqueiro Guillermo Lasso ou o líder indígena Yaku Pérez -, o parlamentar apontou que o movimento não tem nenhuma preferência de adversário. "Brasil é um país muito futebolístico, então vou te dar uma resposta em termos futebolísticos. Se uma equipe se preocupa mais sobre qual será seu adversário, isso depõe contra essa equipe", declarou.

"Nós temos que nos preparar da forma mais adequada para enfrentar qualquer que seja o adversário no segundo turno. Nós temos que nos fortalecer. Pode ser Yaku Pérez, pode ser Guillermo Lasso. O que nós queremos é que chegue ao segundo turno quem realmente teve os votos para isso, que não aconteça nenhuma 'surpresa'", completou.

Na sequência, comentou sobre quem são os dois adversários. Para Muñoz, Lasso - agora o mais provável de ir ao segundo turno - é o representante da extrema-direita "com posições conservadoras, apesar de não ser a mesma coisa que Bolsonaro".

"Lasso é parte de uma direita tradicional, conservadora, extrema-direita, vinculado com o capitalismo financeiro especulativo. É o pior capitalismo do mundo, que não vive da produção, vive da especulação. É um capitalismo que não acredita em seu país, acredita no capital", definiu.

Já sobre o outro potencial adversário, que perdeu fôlego na apuração após a contagem dos votos de Guayaquil, Muñoz apontou que não é possível classificar como progressista.

"Primeiro, Carlos Pérez é seu nome. Para mim, ele não representa os setores progressistas. Alguém que se mostra a favor de uma violência da ordem constitucional como houve no Brasil e na Bolívia... Alguém que diz vir do setor indígena mas desconhece a grande mobilização de outubro de 2019, protagonizada pelo movimento indígena, não pode ser classificado como progressista. Além disso, acho que o setor indígena tem alguns líderes que poderiam ser muito mais importantes nesse momento", avaliou.

Postagens feitas por Pérez nas redes sociais e declarações públicas a emissoras de TV mostram algumas das controvérsias do ambientalista, que, entre outras coisas, defendeu o golpe no Brasil e na Bolívia.

Assembleia Nacional

A vitória da Revolução Cidadã também se refletiu na composição da Assembleia Nacional, conforme previsto por Pabón. Além dos 31,2% alcançados pela coligação Unes, chapas não-correístas do campo progressista conseguiram uma ampla maioria das cadeiras.

"A tendência do centro até a esquerda é a ganhadora das eleições da Assembleia Nacional. Com suas matizes, essa tendência . Uns podem ter posições mais progressistas em alguns temas, mais ambientalistas em outros, até conservadoras em alguns, mas em termos de visão ideológica-programática, os equatorianos votaram 70% do centro até a esquerda", declarou Muñoz.

"Os grandes perdedores são a extrema-esquerda, que ficou sem representação, e a extrema-direita. Além disso, a centro-direita é minoritária", completou.

Andrés Arauz tem defendido essa tese em suas redes sociais, apontando um triunfo progressista, no que parece ser também uma tentativa de aproximação com setores que estão por fora da Revolução Cidadã.

Para Muñoz, esse cenário garante governabilidade para Arauz caso ele seja eleito em 11 de abril.

Desafios

Muñoz, que apresentou um processo de impeachment contra o ministro da Saúde, Juan Carlos Zevallos, por conta da má condução diante da pandemia, afirmou que enquanto o mundo enfrenta uma pandemia provocada pelo coronavírus, o Equador vice um desastre provocado pelo 'Morenovírus', em referência ao atual presidente, Lenín Moreno. "Nós temos um desafio de enfrentar esses dois vírus letais, tanto o desafio sanitário do coronavírus quanto o desafio político do Morenovírus", disse.

"Temos que enterrar uma agenda que priorizou o capital e converteu a a saúde e a educação em privilégios. Além de buscar um plano de vacinação. No Equador, chegaram apenas 8 mil vacinas! É ridículo! No Brasil isso não vacinaria nem a USP. No Equador somos quase 18 milhões de habitantes e apenas 4 mil serão vacinados", declarou.

"Se não imunizarmos a população não conseguiremos enfrentar outros dois desafios: recuperar o emprego e a produção", finalizou.