A água, novo objeto de desejo das multinacionais

O negócio das águas minerais engarrafadas se transformou em um dos setores mais lucrativos e de maior expansão no mundo, dominado até há pouco tempo por Nestlé e Danone

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O negócio das águas minerais engarrafadas se transformou em um dos setores mais lucrativos e de maior expansão no mundo, dominado até há pouco tempo por Nestlé e Danone Por Riccardo Petrella É sabido que por mais que as águas minerais sejam de propriedade pública, são as empresas privadas que obtêm grandes e garantidos lucros com sua comercialização. O negócio das águas minerais engarrafadas se transformou em um dos setores mais lucrativos e de maior expansão no mundo, dominado até há pouco tempo por Nestlé e Danone. Agora, estas duas multinacionais têm, em seus calcanhares outras duas “gentis irmãs da água”: a Coca-Cola e a Pepsicola. Também está ficando claro que as empresas privadas de distribuição de água e aquelas de capital misto público-privado, cada vez mais numerosas no setor dos serviços hídricos, estão se apoderando da propriedade e/ou do controle da água potável através do mundo. As companhias francesas Suez-Ondeo e Vivendi-Veolia, por si só, administram a distribuição da água para mais de 250 milhões de pessoas, sem contar aquelas servidas por empresas nas quais possuem participação acionária. O banco privado suíço Pictet prevê que em 2015 as empresas privadas fornecerão a água potável a cerca de 1,750 bilhão de “consumidores”. Neste contexto, não surpreende comprovar que as companhias de gestão de água são sempre mais compradas e vendidas no mercado, como se compra e vende empresas de sapato ou geladeira. O último caso significativo é o da Thames Water, maior empresa hídrica do Reino Unido e a número três no mundo (atrás das duas francesas citadas), comprada pela australiana Macquarie à alemã RWE. A RWE, gigante energético europeu, havia adquirido a Thames Water em 2000 por 7,1 bilhão de euros como concretização de sua estratégia para converter-se na número um das européias multiusos (companhias que operam simultaneamente nos setores de energia, transportes, lixo, água, comunicações etc). A escolha de uma estratégia multiuso também levou, há alguns anos, a italiana Enel a se interessar pela possível aquisição do Acquedotto Pugliese. Por diversos motivos, os dirigentes da RWE decidiram ultimamente se concentrar somente no setor de sua competência para manter-se à altura dos colossos energéticos mundiais em vias de reestruturação e consolidação. Assim, venderam a Thames Water com a mesma velocidade com que compraram. A Thames Water foi adquirida por uma empresa australiana, o Banco Macquarie, que para isso desembolsou cerca de 14 bilhões de euros. Trata-se de um banco especializado em serviços financeiros e investimentos em infra-estrutura. Por exemplo, os aeroportos de Bruxelas e Copenhague são da Macquarie Airports. A companhia está presente em 24 países e tem cerca de 8.900 funcionários. Por que este banco australiano investiu tanto no setor da água, onde também comprou a norte-americana Acquarion por US$ 860 milhões? Por certo que isso não foi por ter um plano industrial e sócioambiental de modernização da rede e do serviço hídrico para os 13 milhões de habitantes da região londrina e dos outros 50 milhões de pessoas atendidas no mundo pela Thames Water. Para Macquarie se trata de uma estratégia puramente financeira: aumentar os níveis de lucro do grupo intervindo em um setor bastante rentável, destinado a ser ainda muito mais lucrativo no futuro se continuarem os processos de privatização e escassez da água para uso humano. No momento em que Margareth Thatcher privatizou a água, em 1989, afirmou que aos britânicos não importa saber quem distribuía a água e que o importante para eles era ter o beneficio de serviço de alta qualidade e a preços convenientes. Mas a privatização da água não deu resultados notáveis em relação aos preços (os aumentos foram consideráveis) nem quanto à qualidade (recentemente a Thames Water foi severamente admoestada por não ter reduzido os níveis de perda de água, de acordo com as obrigações ligadas à tarifa). Os britânicos, por outro lado, aparentemente consideram irrelevante e nacionalidade do gestor da água do Tamisa. De fato, a Thames Water, em 15 anos, passou de propriedade de um organismo público à de uma empresa privada britânica, depois de uma companhia energética alemã e agora a um banco australiano. Não se pode descartar que dentro de 10 anos a propriedade da Thames Water passe a pertencer a uma sociedade chinesa especializada no tratamento de lixo urbano. (IPS/Envolverde)