Bandeira da UNE deve ser distribuição de renda

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Para o jornalista e historiador Arthur Poerner, a questão é a grande luta dos movimentos sociais, incluindo a UNE. Prestes a completar 70 anos, entidade é das mais antigas representação estudantil do mundo.

A partir desta quarta-feira, 4, até domingo, 8, a União Nacional dos Estudantes (UNE) realiza seu 50º Congresso, em Brasília, às vésperas do 70º aniversário da entidade. Para Arthur Poerner, jornalista e autor do livro O poder jovem história política dos estudantes brasileiros, a UNE esteve presente nos principais momentos da história brasileira e hoje contribui para a consolidação da democracia no país. A obra de Arthur Poerner, lançada há 39 anos, teve recentemente sua quinta edição atualizada. O livro fez parte da lista dos primeiros 20 livros proibidos durante a ditadura militar. Em entrevista à Fórum, Arthur Poerner avalia o movimento estudantil, a UNE e sua a importância durante os diversos momentos históricos brasileiro. Para a entidade manter suas atividades financiadas pelo governo federal não é prejudicial e nem atravanca as lutas do movimento. FÓRUM- A UNE chega a seu 50º congresso, as vésperas de completar 70 anos. Como historiador do movimento estudantil como você avalia este momento? ARTHUR POERNER- No Brasil, sempre aconteceram manifestações estudantis na política. No Brasil-Colônia, na independência, na conjuração mineira, na República, contra a chacina promovida pelo exército brasileiro no arraial de Canudos... Mas é a partir de 1937, com a fundação da UNE, o que era manifestação esporádica e transitória passou a ter um caráter permanente, orgânico e nacional. A UNE trouxe para o país uma imensa contribuição, participando do movimento contra o Estado Novo, a favor da Petrobras, em prol da gratuidade do ensino, a favor da cultura popular, contra a espoliação do país pelo capital estrangeiro, pelas reformas de base, pela indústria siderúrgica nacional e contra a ditadura. As contribuições para democratização do Brasil são inúmeras. Há poucas instituições brasileiras que podem se orgulhar de ter uma participação tão grande neste movimento de democratização do país. Em 1979, a partir do 31º Congresso, em Salvador, a UNE voltou a ter grande participação no cenário político brasileiro. Hoje, a entidade está inserida em um Brasil em vias de democratização e de desenvolvimento. Ela não se encontra mais sozinha como esteve, por exemplo, em 1968. Houve um momento, a partir de abril de 1968, logo após o assassinato do estudante Edson Luiz, em que a UNE foi à única resistência a ditadura militar por ser, à época, uma entidade menos vulnerável. Isso porque englobava a classe média. Atualmente, a UNE é uma das entidades que compõe a Coordenação dos Movimentos Sociais, a CMS, com a CUT [Central Única dos Trabalhadores], o MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], entre outras. Desconheço uma entidade que congregue a participação estudantil tão antiga quanto a UNE. FÓRUM- A UNE recebe criticas por ter seus projetos patrocinados pelos governo federal. Qual sua opinião a respeito? POERNER - Não vejo problemas. Ministérios como o da Cultura podem apoiar projetos do movimento estudantil. O Cuca-circuito universitário de cultura e arte, por exemplo, faz um ótimo trabalho em vários estados. Em janeiro deste ano, a UNE realizou a 5ª Bienal de Arte e Cultura, foi o maior festival universitário da América Latina. Não vejo pontos negativos em o governo federal apoiar iniciativas produtivas. FÓRUM- Mas o patrocínio não poderia intimidar a UNE a questionar posturas do governo federal como a reforma universitária? POERNER- Movimentos como a UNE não são sempre obrigadas a serem contra. A UNE era contra a ditadura, não é contra um governo democrático que procura dialogar com ela, assim como é no governo Lula, ou foi no governo João Goulart e Itamar Franco. FÓRUM- O governo respeita os direitos dos estudantes? POERNER- Em minha opinião, sim. Um exemplo claro foi quando a UNE reconquistou, em fevereiro deste ano, o terreno na praia do Flamengo, a antiga sede da UNE queimada na ditadura. O ministro Tarso Genro, representando o governo, esteve presente manifestando o apoio e reafirmando o canal de diálogo. O governo não visitava a UNE desde 1962. No mesmo local, naquele ano, o presidente Goulart e todo seu ministério estiveram presentes para agradecer o apoio que a UNE à cadeia da legalidade. Com a renúncia do Jânio Quadros, em 1961, os militares se opuseram a posse, de João Goulart prevista pela constituição. A UNE, na época presidida por Aldo Arantes, foi a Porto Alegre apoiar a cadeia da legalidade, criada pelo [Leonel] Brizola para dar apoio ao presidente Goulart. FÓRUM- A reitoria da USP que ficou ocupada por estudantes durante 52 dias afirmava que nenhuma entidade os representava. Isto seria uma nova forma de organização do movimento estudantil? POERNER- O movimento que ocupou a reitoria não foi muito conhecido pela população. Eu vivo no Rio de Janeiro e não consegui ter acesso a informações sobre a ocupação. Procurei ler todos os jornais que traziam notícias e acredito que o movimento que ocupou a reitoria é uma forma nova, se propõe a não ter lideranças a funcionar com colegiados. É difícil opinar ou classificar um movimento que ainda não tem uma linha, um documento que defina suas reivindicações. Mas, me parece um movimento setorial e transitório. FÓRUM- O senhor citou uma série de lutas na qual a UNE fez parte. Atualmente qual é a principal bandeira do movimento estudantil? POERNER- A maior bandeira a ser defendida no Brasil, hoje, e que é da UNE, também, é pela consolidação da democratização e pela melhor distribuição de renda.