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“Brasil, Pátria Educadora”, lema de governo anunciado por Dilma Rousseff em sua posse, por um lado, é frase caracterizada pela ausência de verbo a indicar ação. Por outro, soa um chamado, pela utopia necessária que os dois substantivos e o adjetivo, juntos, denotam. Lema que invoca reflexão mais aprofundada no contexto do pronunciamento da presidenta
Por Everaldo Batista da Costa*
“Brasil, Pátria Educadora”, lema de governo anunciado por Dilma Rousseff em sua posse, por um lado, é frase caracterizada pela ausência de verbo a indicar ação. Por outro, soa um chamado, pela utopia necessária que os dois substantivos e o adjetivo, juntos, denotam. Lema que invoca reflexão mais aprofundada, no contexto do pronunciamento da presidenta, a qual o considera “direto”, “mobilizador”, capaz de refletir, claramente, “qual será a nossa grande prioridade e sinaliza para qual setor deve convergir o esforço de todas as áreas do governo”.
A avaliação das políticas do Estado e dos governos, na longa duração do Brasil Republicano, definitivamente, não sugere prioridade na educação, a qual sempre foi tratada como “apêndice pobre” de um país marcado por uma “modernização conservadora” e uma “industrialização a baixos salários”. Exemplo singular desse descaso educacional faz-se no consagrado Plano de Metas de Juscelino Kubitscheck, que, ao englobar ¼ da produção nacional do período, teve 43% de seu investimento em energia, 29,6% em transportes, 20,4% na indústria de base, 3,6% em alimentação e 3,4% em educação (para orientar e intensificar a formação de pessoal técnico: “educação para o desenvolvimento”).
O espaço nacional fragmentado evidencia que a “Aceleração do Crescimento” (investimentos na equipagem do território em escala macro para a reprodução hegemônica do capital) desconexa de ações pelo desenvolvimento social (como investimento pesado em educação básica, fundamental, técnica e superior) produz resultados financeiros a particulares, a agravar a condição social da massa de brasileiros pobres e a negar o ideal “Pátria Educadora”. A educação enquanto “apêndice” reforça a dificuldade popular de acesso ao mercado de trabalho, a destruição dos sistemas tradicionais de autoprodução camponesa, a escravidão rural e urbana, a emergência de novos cortiços, favelas e guetos nas grandes, médias e pequenas cidades e, sobretudo, a desinformação e a cegueira política.
Uma reforma educacional é necessária ao Brasil e abundam estatísticas e estudos para tanto. O INEP-MEC, por exemplo, produz o Censo Escolar, que dá um panorama nacional da educação e serve de referência numérica para a formulação de qualificadas políticas públicas e execução de programas na área. Porém, por mais que essa reforma dependa da consciência política e moral de dirigentes do Estado, é imperante um esforço conjunto da sociedade, onde cada indivíduo reconheça e valorize seu papel na construção da “Pátria Educadora” ou de uma nação democrática de fato.
Múltiplas são as escalas e os modos de atuação individual e coletiva para essa empreitada, a começar pela indicação de proposições, cobrança e vigília permanente aos representantes do povo. Na esfera educacional, especialmente, professores, pais e alunos devem somar força no debate sobre qual educação se almeja, face ao cenário desolador de precarização das escolas públicas e de banalização do ensino e da pesquisa nas universidades.
O desmantelamento do ciclo vicioso de problemas infraestruturais e de qualificação, que atinge a vida de professores e alunos – dentro e fora das escolas e das universidades –, depende do saneamento da estrutura socioeconômica brasileira, ou seja, carece da anunciada correlação “Aceleração do Crescimento” pari passu a “ações concretas de desenvolvimento social”.
Aos docentes universitários, cumpre levar o mundo à sala de aula, pela formação cidadã, consciente, criativa e crítica dos futuros professores escolares. A pressão pelo produtivismo quantitativo acadêmico, que burocratas das agências de fomento dos governos estaduais e federal imprimem às universidades, na esteira lógica da “Aceleração do Crescimento”, cria uma ilusão de ciência que retira professores de seu legítimo lugar: a sala de aula.
Um “Brasil, Pátria Educadora” também depende da conjugação e da ação do verbo educar em todas as pessoas do plural e do singular.
* Everaldo Batista da Costa é professor do Departamento de Geografia da Universidade de Brasília (UnB)
Foto de capa: Marcello Casal Jr/ABr