Com sangue de professora não se escreve educação

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O tanto que se fala na importância da educação é equivalente ao tamanho da hipocrisia daqueles que discursam em seu favor. Na prática, poucos de fato se incomodam com as injustiças impostas aos professores e ainda menos dão atenção para o currículo escolar. O que aconteceu ontem (29) em Curitiba é um exemplo sólido dessa demagogia: professores protestavam contra a votação de um projeto de lei do governador Beto Richa (PSDB), que altera a previdência dos funcionários públicos do Paraná – a ParanaPrevidência. Como resposta, a polícia os agrediu com todas as ferramentas autorizadas pelo governador do Estado. O resultado pode ser visto em incontáveis imagens compartilhadas nas redes sociais, com professores sangrando, feridos e em pânico. Apesar da gravidade da repressão e violência policial, a grande mídia insiste em chamar o fato de "confronto" e a população engole essa velha ladainha perversa, acreditando - e dizendo por aí - que os professores estão errados por estarem em greve e protestando. Nesse momento, todo o papo furado de que a educação é o valor mais importante do país, todas as mensagens compartilhadas no Facebook dizendo que professores são heróis e mestres, tudo isso vai pelo ralo, junto com a imundície dos aparatos do Estado, que serve somente para violentar e oprimir. Quem de fato se importa com a educação e acredita que ela é a chave para uma sociedade melhor, mais justa e igualitária, não pode se calar nesse momento. O movimento feminista, por exemplo, deve reconhecer que há muitas questões de gênero emaranhadas nesse processo, que as professoras agredidas estão sendo violentadas também como mulheres, que os salários baixos não garantem o bem estar dessas profissionais, que criam seus filhos, enfrentam o machismo e ainda dedicam suas vidas para ensinar outras crianças, jovens e adultos. A situação da educação no Brasil não é algo que se reflete apenas na capacidade de ler ou fazer cálculos matemáticos, mas também em diversas esferas sociais. Há muitas leis que não se cumprem, como a lei 10.639/03, que deveria garantir o ensino da história e cultura afro nas escolas; mas, na prática, isso não se concretiza e o resultado é que, embora o país tenha mais de 50% da população autodeclaradamente negra, as pessoas não conhecem a história dos negros no Brasil, nem sabem nada a respeito da África - embora saibam sobre a Europa e os EUA. Assim, continuamos aceitando o racismo como valor natural da cultura brasileira. Além disso, a escola também deveria combater a misoginia, também deveria ser formada por profissionais capacitados para ensinar ideias de igualdade, de respeito e diversidade, mas na realidade reproduz machismo, separa pessoas por causa de seus gêneros e não oferece uma educação sexual eficiente. Também vivemos uma realidade educacional onde pouquíssimos profissionais estão preparados para atender crianças, jovens e adultos que precisem de LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) para se comunicar e serem entendidas. Entre tantas outras carências que são, sim, preocupações importantes para os movimentos de mulheres, o movimento negro, LGBT, entre outros militantes de Direitos Humanos. Não é possível garantir que essas pautas sejam contempladas e que uma educação transformadora se concretize sem que os profissionais sejam valorizados, bem pagos, respeitados e capacitados. Um Estado que espanca professores e professoras jamais se importará com essas questões; pelo contrário, isso só indica os valores retrógrados, conservadores e discriminatórios que deseja perpetuar. Precisamos fazer barulho e denunciar essas violências, falar em favor das professoras e professores e fazer pelas redes e pelas ruas o trabalho informativo que a grande mídia vendida e manipuladora não faz. Foto de capa: Reprodução / Facebook - Professoras agredidas em Goiânia, no último dia 23. Repressão contra educadores é prática habitual da polícia.