Darfur: E agora, a fome

Uma grande fome ameaça Darfur, segundo integrantes do Parlamento Europeu que acabam de retornar de uma visita a essa região do Sudão, devastada pela guerra

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Por David Cronin/IPS Uma grande fome ameaça Darfur, segundo integrantes do Parlamento Europeu que acabam de retornar de uma visita a essa região do Sudão, devastada pela guerra. O Parlamento, de 758 membros, vota hoje uma resolução que, se for aprovada, exigirá dos governos da União Européia a imposição de sanções econômicas e diplomáticas a personalidades sudanesas implicadas com a violência em Darfur. Os eurodeputados poderiam recomendar medidas como a proibição de viajar aos países que integram a UE e congelar os ativos radicados em seu território. Esta iniciativa acontece depois da visita de cinco legisladores a Darfur entre 30 de junho e 6 deste mês. Ali foram testemunhas de primeira mão das precárias condições em que vivem as pessoas afetadas pela violência. O eurodeputado alemão pelo partido verde, Frithjof Schmidt, disse que as condições de insegurança colocam em risco a distribuição da ajuda alimentar aos 2,5 milhões de pessoas que tiveram de abandonar suas casas desde 2003 até hoje. No mês passado, a organização Oxfam anunciou que estava abandonando paulatinamente suas atividades em Gereida, o maior acampamento de refugiados de Darfur, com mais de 130 mil pessoas. A Oxfam informou que os responsáveis pelo controle da área não tomaram medidas suficientes para abordar o problema dos ataques contra os socorristas. Outras organizações humanitárias também decidiram que é extremamente perigoso trabalhar em Darfur. “Se as condições de segurança não se estabilizarem rapidamente, as organizações de ajuda não poderão continuar com a provisão de alimentos básicos. Avizinha-se uma grande fome de proporções dramáticas”, advertiu. O eurodeputado identificou duas causas para os problemas de segurança. Uma é o reinado de terror imposto pela milícia Janjaweed (Homens a cavalo), considerada como uma força que segue os ditames do governo do Sudão. A segunda razão são as lutas para conseguir maior influência entre os grupos rebeldes contrários às autoridades de Cartum. “A fragmentação dos rebeldes em cerca de 18 grupos competindo entre si ameaça cada vez mais a implementação dos esforços internacionais de ajuda”, explicou Schmidt. “É quase impossível realizar os acertos necessários para a entrega e os bandidos estão se convertendo em uma ameaça constante”, acrescentou. Além disso, o deputado alertou que não haverá uma melhoria da situação num futuro próximo. Uma força de paz conjunta da Organização das Nações Unidas e a União Africana não seria enviada à região antes de 18 meses, disse Schmidt. Até que isso ocorra, prosseguiu, o mandato de uma força de paz exclusiva da UA, composta por cinco mil homens e que já está na região, deveria ser modificada para que se dedique a proteger ativamente a população civil. Entre 2004 e 2006, a UE deu US$ 550 milhões a esse contingente da UA. Schmidt disse que o financiamento dessa operação deve ser garantido, e exortou a União Européia a realizar uma “contribuição significativa” para prolongá-la no tempo. O presidente do Comitê de Desenvolvimento do Parlamento Europeu, o socialista espanhol Joseph Borrell, que liderou a delegação na visita à Darfur, descreveu a situação na província como “uma beberagem diabólica” que a missão da UA não está em condições de controlar. “Só o que podem fazer é redigir informes”, ressaltou. “A única alternativa é enviar uma nova missão, diferente da atual. Não é uma panacéia, mas somente se encontrará uma solução quando alguém estiver em condições de impô-la”, acrescentou. Representantes do governo sudanês que se entrevistaram com os eurodeputados disseram que existe uma “trama no estilo hollywoodiano”, que teria sua origem na antipatia dos ocidentais em relação ao Sudão, acrescentou. O texto da resolução que será votada hoje acusa as autoridades de Cartum de “violarem descaradamente” o embargo de armas imposto pela ONU. Também reclama da China, maior importador de petróleo sudanês, a suspensão de suas vendas de armamentos e a deixar de lado suas objeções à imposição de sanções contra o Sudão por parte das Nações Unidas. Além disso, pede que o governo de Cartum entregue o ministro de Bem-Estar Social, Ahmad Muhammad Arun, e Ali Kushayb, um líder dos Janjaweed, ao Tribunal Penal Internacional. O promotor desta corte, Luis Moreno Ocampo, os acusou em fevereiro passado de crimes de guerra e contra a humanidade. Arun encabeçou pessoalmente uma campanha de incitação e recrutamento que permitiu que as atrocidades em Darfur continuassem, afirmou Ocampo em sua acusação. O diretor do escritório de Bruxelas da Human Rights Watch, Lotte Leitch, criticou os governos europeus por fracassarem em impor sanções efetivas contra o Sudão. Além disso, deveriam ser identificados os ativos que as autoridades de Cartum e pessoas próximas a elas possuem na Europa, para que possam ser congelados. Existe um antecedente, acrescentou Leitch: a UE rastreou os bens do ex-ditador iugoslavo Slobodan Milosevic e de sua família. “Se a União Européia não fizer seu dever, a conclusão dos sudaneses é que o bloco não é serio. E, então, para que mudar?, disse em conversa com a IPS. Portugal, que exerce a presidência rotativa da UE, deveria indicar “alto e claro” que “uma completa cooperação” com o Tribunal Penal Internacional é essencial, acrescentou o representante da HRW. “O Sudão deve entregar seu ministro de Be-Estar Social e o outro acusado, que já está sob custódia. Não estamos falando de pessoas foragidas”, afirmou. A União Européia é a fonte principal de ajuda humanitária aos civis de Darfur, e este ano comprometeu para esse fim US$ 393 milhões. Outro eurodeputado, o liberal francês Thierry Cornillet, afirmou que existe margem para uma assistência maior. “O importante é salvar vidas. Devemos incrementar a ajuda humanitária sem esquecer que é necessária uma solução política para o conflito”, acrescentou. (IPS/Envolverde) Crédito da imagem: Refugees International (Envolverde/ IPS)