Obama: nove dólares para a Defesa, um para a mudança climática

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O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, propôs dedicar um dólar para a luta contra a mudança climática para cada nove destinados à defesa em 2010, segundo o estudo divulgado ontem pelo Instituto de Estudos Políticos, com sede em Washington. O atual governo dá mais importância à mudança climática do que o de George W. Bush, quando a proporção foi de um dólar para a mudança climática para cada 88 destinado à defesa, segundo o informe “Military vs. Climate Security: mapping the shift from the Bush years to the Obama era” (Defesa vs. Segurança climática: dos anos Bush à era Obama).

O presidente norte-americano considera que a mudança climática representa uma grave ameaça para a segurança nacional e internacional. Mas, será difícil sustentar a designação de recursos para lutar contra esse problema ambiental porque a maior parte do orçamento está incluída na Lei de Recuperação e Reinvestimento Norte-americano, aprovada em fevereiro deste ano. De fato, US$ 68 bilhões dos quase US$ 79 bilhões destinados a combater a mudança climática já estão no pacote de estímulo, uma destinação única para impulsionar a economia após a crise financeira desatada em setembro passado, diz o estudo.

O orçamento básico para lidar com o fenômeno ambiental em 2010 chegará a US 10,6 bilhões, quantia ínfima em relação à destinada ao pentágono, US$ 434 bilhões. Além disso, o orçamento militar não contempla as atuais guerras no Afeganistão e Iraque, cujo gasto estima-se que será superior a US$ 150 bilhões. “Obama considerou a mudança climática ‘o desafio de nosso tempo’ e começou a destinar fundos para sustentar sua retórica”, disse Miriam Pemberton, autora do informe do Instituto de Estudos Políticos.

“Mas, será difícil manter os fundos para enfrentar o desafio ambiental devido ao déficit orçamentário no qual estamos imersos”, ressaltou Pemberton. “Uma forma importante de conseguir o dinheiro é reduzir o gasto em insumos bélicos que não necessitamos para que o investimento em segurança possa ajustar-se à magnitude relativa das ameaças que temos pela frente”, acrescentou.

O governo de Obama deve fazer o impossível para incorporar aos próximos orçamentos básicos os recursos necessários para a luta contra a mudança climática, como os previstos no pacote de estímulo, a fim de poder enfrentar os desafios que supõe esse fenômeno, diz o documento de 65 páginas, o último de vários estudos feitos pelo Instituto nos últimos sete anos.

As consequências da mudança climática preocupam diversos setores dos Estados Unidos. Há dois anos, vários generais e almirantes da reserva produziram o informe “National Security and the threat of climate chance” (Segurança nacional e a ameaça da mudança climática). O estudo concluiu que as consequências do aquecimento global originarão conflitos internacionais por recursos vitais como água doce, haverá distúrbios e surgirão comportamentos extremistas nos países, além da escassez de alimentos e migrações maciças. “A mudança climática multiplica os riscos de instabilidade na maioria das regiões conflitivas”, diz o informe dos militares.

Dois grupos de estudo, o Centro de Estudos Internacionais e Estratégicos (CSIS) e o Centro para uma Nova Segurança Norte-americana (CNAS), divulgaram meses depois “The age of Consequences (A era das consequências), de 119 páginas. O aumento da temperatura e a elevação do nível do mar causado pelo aquecimento global darão origem a migrações maciças de, “talvez, milhares de milhões de pessoas” no próximo século caso se concretizem alguns dos piores prognósticos científicos. “O aquecimento do planeta pode desestabilizar o mundo”, disse na época o presidente do CNAS, Kurt Campbel.

“Creio que esse será o assunto-chave de nossa época”, destacou o atual secretário-adjunto de Estado para assuntos da Ásia-Pacífico. Também o Conselho Nacional de Inteligência divulgou pouco depois um informe especial no qual coincide com a funesta análise e conclui que a mudança climática pode ter “graves consequências para a segurança nacional” e “por em risco a estabilidade interna de alguns países, bem com causar conflitos internos e, menos provável, entre Estados, especialmente pela maior escassez de água”.

A Comissão de Relações Exteriores do Senado organizou sua primeira sessão sobre mudança climática e segurança global na semana passada. O senador do opositor Partido Republicano, Richard Lugar, alertou para os efeitos nefastos de não cuidar do problema. “As consequências da mudança climática incluem maior risco de secas, fome, enfermidades e migrações maciças, todos possíveis estopins de conflito”, afirmou. “Para preparar nossas forças militares para as futuras ameaças, devemos compreender a forma com a mudança climática se converte em uma fonte de instabilidade e origina uma guerra”, acrescentou Lugar.

O informe divulgado ontem pelo Instituto de Estudos Políticos elogia Obama por compreender a importância da mudança climática e reduzir a brecha entre o orçamento militar e o ambiental. A diferença de 88 dólares para a defesa para cada dólar destinado à luta contra a mudança climática, característica do governo Bush, pode cair para nove dólares por um graças ao fundo adicional do pacote de estímulo. Se não houvesse esse dinheiro, a proporção seria de 65 por um. “Se essa partida única não se integrar ao orçamento de base” a brecha voltará a aumentar, recorda o informe.

Atualmente, não há um orçamento básico para lutar contra a mudança climática, em especial porque o dinheiro está dividido em diversos ministérios, desde o Departamento de Estado até o de Transporte. Em 2010, Obama destinará US$ 10,6 bilhões à luta contra a mudança climática, conclui o informe. A brecha entre os dois orçamentos se reduz de forma significativa quando se leva em conta a destinação incluída no pacote de estímulo. Mas o governo investe 20 vezes mais em pesquisa e desenvolvimento militar do que em fontes de energia limpa.

O orçamento de 2010 reduz muito pouco a brecha entre o gasto militar e o ambiental, mas se forem considerados os US$ 17,3 bilhões adicionais do pacote de estímulo para pesquisa e desenvolvimento em energia limpa, a diferença entre o gasto de defesa e o climático passa a ser de quatro dólares por um. Em 2008, Washington destinou 50 vezes mais recursos para dar armas a vários países do que em ajudar os pobres em questões de energias limpas e em seus programas de ajuda estrangeira. Obama propôs multiplicar por mais de três o fundo de ajuda estrangeira no próximo ano a fim de elevá-lo a US$ 717 milhões, em relação aos US$ 121 milhões atuais.

A brecha entre gasto militar e climático diminui de forma significativa, mas, como o governo destinou quase US$ 2 bilhões adicionais a programas de assistência militar no pacote de estimulo, prejudicou os esforços que havia feito para corrigir o desequilíbrio. Investir na luta contra a mudança climática gera mais postos de trabalho do que a indústria bélica. Além disso, os exércitos dependem de fundos públicos, enquanto as iniciativas ambientais incentivam a participação do setor privado. Por fim, investir mais em programas verdes do que na defesa não necessariamente implica a perda de fontes de trabalho no setor de armamento porque a alta tecnologia desenvolvida na indústria militar pode transferir-se facilmente para iniciativas ambientais, segundo o informe. IPS/Envolverde

* O blog de Jim Lobe sobre política externa é: www.ips.org/blog/jimlobe/

(Envolverde/IPS)