Por dentro da brutalidade do governo militar no Egito

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Desde o golpe que tirou Mohamed Morsi do poder, a violação dos direitos humanos no país se tornou cada vez pior. Dados indicam torturas, mais de 2 mil mortes e 16 mil prisões Por Medea Benjamin e Kate Chandley, em Codepink | Tradução: Vinicius Gomes Após uma visita recente de uma delegação da organização pacifista Codepink ao Egito ter terminado em deportações e agressões, ficaram evidentes alguns dos horrores que os egípcios estão encarando na esteira do golpe de 3 de julho de 2013, que derrubou o presidente eleito Mohammed Morsi: mais de 2.500 civis foram mortos em protestos e confrontos com forças de segurança; mais de 16 mil estão na prisão por suas crenças políticas e as denúncias de tortura são inúmeras. Milhões de pessoas que votaram em Morsi – nas eleições que os observadores internacionais declararam como legítimas – estão vivendo em terror, assim como estão os oponentes seculares do regime militar. Os níveis de violência não têm precedentes na história moderna do Egito. Com o antigo ministro da defesa, Abdel Fatah al-Sisi sendo considerado o próximo presidente em eleições já também consideradas fraudulentas, o militarismo egípcio está dando passos largos para conseguir acabar com os levantes que ganharam os corações da comunidade internacional durante a Primavera Árabe. O caso mais notório é o julgamento de três jornalistas da Al Jazeera e seus defensores, denunciados por fabricarem notícias falsas e trabalharem junto da Irmandade Muçulmana. Em 10 de abril, houve uma tentativa ridícula de apresentar provas contra eles – que consistiram na base das acusações – mas não passavam de fotos de família, cavalos no campo e refugiados somalis no Quênia. O juiz dispensou as “evidências”, mas não as acusações. Esse caso é apenas o mais notório do vasto ataque contra a liberdade de expressão no país. O governo já fechou diversos canais de televisão e redações de mídia impressa, afiliados com a Irmandade e outras correntes islâmicas. O Comitê de Proteção a Jornalistas classificou o Egito como o terceiro país mais mortífero para jornalistas em 2013, atrás apenas da Síria e do Iraque. Um incidente que mostra como o sistema judiciário está trabalhando lado a lado com os militares foi o infame 24 de março, onde 529 partidários de Morsi foram condenados à morte em um julgamento em massa. O grupo inteiro foi acusado de matar um policial. O julgamento consistiu em duas sessões, cada uma durando menos de 1 hora. O Secretário de Estado dos EUA, John Kerry, disse que a sentença desafia a lógica e a Anistia Internacional chamou a decisão de “grotesca”. Nem mesmo quem possui passaporte dos EUA (aliados modernos do regime militar egípcio) escapam da perseguição: Mohamed Soltan, de 26 anos e formado pela Universidade de Ohio, estava trabalhando no auxílio a veículos de imprensa da língua inglesa em suas coberturas nos protestos contra o golpe militar na praça Rabaa, que foi violentamente reprimida pela polícia e resultou na morte de mais de 1.000 pessoas. Na cadeia há mais de 7 meses, Soltan está em uma greve de fome desde 26 de janeiro e agora está tão fraco que não consegue nem andar. Sua situação na prisão tem sido horrível: quando foi preso, Soltan estava com um ferimento a bala que ainda não havia curado. Os oficiais da prisão se recusaram a tratar dele, então outro prisioneiro que era médico realizou uma cirurgia com alicate no chão imundo da prisão, sem qualquer anestesia. Seu julgamento já foi adiado diversas vezes e não existe qualquer previsão de que realmente vá acontecer. (ativistas nos EUA estão se mobilizando em sua defesa). Ativistas feministas também têm encarado experiências desumanas. Em fevereiro, quatro mulheres foram presas por participarem de protestos contra os militares, e alegam que foram submetidas a “testes de virgindade”, enquanto estavam presas – uma prática que o líder do golpe e futuro presidente apóia. Somando-se ao horror dos testes de virgindade, a Anistia Internacional também relatou que as mulheres presas no Egito têm de passar por duras condições, que incluem serem obrigadas a dormir no chão e não poderem utilizar o banheiro por 10 horas (das 10 da noite às 8 da manhã). As organizações Mulheres Contra o Golpe e Organização Árabe pelos Direitos Humanos, relataram espancamentos e assédios sexuais de mulheres na prisão. A situação interna pode ficar ainda pior: uma nova legislação “antiterrorista” está para ser aprovada pelo presidente egípcio aumentando o poder do governo em acabar com a liberdade de expressão e aprisionar oponentes. Dois novos rascunhos de lei violam o direito à liberdade de expressão, incluindo penalidades de até três anos de prisão por se insultar verbalmente um funcionário público ou membro das forças de segurança. O governo amplia a definição existente de terrorismo para incluir ações que visam prejudicar a unidade nacional, os recursos naturais, monumentos, sistemas de comunicação, a economia nacional ou atrapalhar o trabalho dos corpos jurídicos e diplomáticos no Egito. “O problema com essas definições vagas de ‘atos terroristas’ é que elas permitem que as autoridades movam um caso contra praticamente qualquer ativista pacífico”, disse Hassiba Hadj Sahraoui, da Anistia Internacional. O rascunho da legislação também aumenta o escopo para o uso da pena de morte para incluir “administração ou gerenciamento de grupos terroristas”. A Irmandade Muçulmana foi classificada como grupo terrorista pelas autoridades egípcias em dezembro passado – apesar de não existir qualquer prova factual de terem se engajado com terrorismo. O governo norte-americano se recusa a chamar a destituição de Morsi como “golpe” e continua a fornecer 250 milhões de dólares como apoio econômico, assim como financiamento para controle de narcóticos e treinamento militar, mesmo tendo os antigos 1.3 bilhões de ajuda militar suspensos.