REFLEXÕES PARA 2024

Desmatamento zero vem aí

Que as próximas gerações se virem para conviver com desertos que encontrarão

O deserto.Créditos: Divulgação/Pexels
Escrito en OPINIÃO el

Vejo notícias de diminuição do desmatamento em várias regiões e aumento em outras. Na Amazônia, diminuiu, mas no Cerrado, que é “a caixa d’água do Brasil”, aumentou. E muito. Na Caatinga e no Pantanal, também. Nisso, chego a “amaldiçoar” uma das empresas públicas mais admiráveis do Brasil, a Embrapa, que desenvolve variedades vegetais adaptáveis a climas diferentes das naturalmente exigidas por elas. Por exemplo: trigo para regiões de clima tropical. E desenvolve também pesquisas para “melhoria” de solos para receber novas espécies de plantas.

Por exemplo: o solo do Cerrado era considerado inadequado para o plantio de soja. Com técnicas desenvolvidas pela Embrapa, a “melhoria” do solo e o desenvolvimento de variedades de soja adaptadas para a região, o Cerrado passou a ser devastado pelo agronegócio.

E lembro mais uma vez: o Cerrado é a “caixa d’água do Brasil”. Nesse bioma nascem rios que abastecem as bacias dos rios Paraguai e Paraná, São Francisco e Amazonas. Com a devastação, o subsolo não armazena água e vai influenciar no regime desses rios todos. E tome problema climático, ambiental e não sei que mais.

Sem contar que das cerca de dez mil espécies vegetais do Cerrado, mais de mil, muito mais, ainda não foram pesquisadas pela ciência. Quantas plantas medicinais e de valor alimentício estão desaparecendo?

Agora, chego no desmatamento zero, não já em 2024, mas dentro de poucos anos. Se uma região tem 1 milhão de hectares de mata, num ano desmatam 100 mil, e o que resta de mata vai diminuindo. De 1 milhão viram 900 mil, 800 mil... Mesmo que diminua para 50 mil hectares de desmatamento por ano, depois 30 mil etc., chegará a um ponto em que não sobrará nada, então o desmatamento será zero, não é?

Uma política ambiental pra valer não pode se limitar a reduzir o índice de desmatamento. Tem que parar já e recuperar o que foi desmatado. Mas como o agronegócio, junto com outros setores que considero pouco recomendáveis dominam as políticas públicas, falar essas coisas é chamar encrenca. Afinal, a balança comercial é favorecida pela exportação de soja e outras “commodities” detonadoras do meio ambiente, fecham-se os olhos para o futuro. Que as próximas gerações se virem para conviver com desertos que encontrarão.

Umas previsões pessoais

Aproveito para prever umas coisas pra mim mesmo. Decidi no final de 2023 parar de contar causos na rádio Brasil de Fato a partir de janeiro de 2024. Não sofri nenhuma pressão pra isso, foi decisão pessoal e continuo gostando o mesmo tanto do Brasil de Fato.

Todo fim de ano, vejo pessoas tomando decisões ou fazendo promessas sobre o que vão e o que não vão fazer no ano seguinte. E brinco, tomando decisões também, mas minhas decisões não são pra me privar de algum prazer, ao contrário, são de não fazer coisas que não gosto. Deixei pra fazer minhas previsões depois da virada do ano. Então, lá vão algumas decisões que vou fazer de tudo para cumprir.

- Não vou a nenhum rodeio nem show de sertanejo universitário.

- Não vou à praia de Balneário Camboriú, cheio de prediões bestas e gente que não gosto.

- Não vou a um jogo de futebol e ficar no meio de qualquer torcida organizada.

- No ano que começa vai ter eleições pra prefeito e vereador, e juro que não vou votar em alguém que tenha qualquer proximidade com o bolsonarismo.

- Não vou escrever em sociologuês, economês ou internetês e nem a “linguagem neutra”. Nada de “todes” e afins.

- Não vou assistir à bobagem que é o BBB, muito menos torcer por qualquer participante.

- Não vou ler livro de autoajuda.

- Não vou participar de festa do raloín.

- Não vou virar militante de qualquer religião, e muito menos pagar dízimo para algum aproveitador.

- Se ganhar na loteria, o que é muito improvável, não vou viajar pra Miami nem comprar um carrão importado.

- Não vou entrar alegremente num restaurante e pedir um prato de dobradinha ou de feijoada vegana.

- Esta eu gostaria que não fosse necessária: vou continuar frequentando cada vez mais médicos, farmácias e laboratórios.

Bom... Tem umas coisas que eu gostaria que acontecessem, mas não dependem de mim. Há muitos anos que torço pra isso, e não acontecem. Por exemplo:

- Ver São Paulo se transformar numa cidade com trânsito bom, sem enchentes e sem moradores sem-teto, e poder caminhar pelas ruas do centro de São Paulo qualquer hora do dia ou da noite sem medo de ser assaltado.

- Ver o fim do desmatamento e a recuperação da Floresta Amazônica, do Cerrado, da Caatinga, do Pantanal e da Mata Atlântica. E também o fim da devastação dos campos, que não têm grandes matas, mas tem muita vida vegetal e animal. O Brasil não precisa desmatar. Tem áreas agricultáveis suficientes e sobrando, para alimentar sua população e exportar alimentos pro mundo, de preferência não de forma bruta, mas industrializada ou semi-industrializada.

- Saber que todas as terras indígenas estão demarcadas e protegidas, e sua população vivendo sob o modo de vida que querem, com suas religiões ou crenças, sem agressões e preconceitos.

- Saber que as populações quilombolas também tenham suas áreas demarcadas e o mesmo tratamento que as indígenas.

- Ver a reforma agrária ser feita pra valer e o Brasil todo plantando comida saudável pro povo brasileiro.

Ah, uma coisa depende muito de mim, mas não só de mim. Minha vaidade e meus bolsos vão continuar sonhando: gostaria de ver meus livros sendo comprados e lidos por muitos milhares de pessoas. Pena, né? Sou escritor só pros amigos. Gosto muito, mas até que seria bom se meus livros fossem lidos por muita gente... e me desse um lucrinho bom, né?

*Este não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.