PF E STF EM AÇÃO

Ação contra os Bolsonaro: passa da hora de esmagar a cabeça da hidra fascista civil e militar - Mauro Lopes

Qualquer vacilação na luta contra o fascismo e punição aos líderes civis e militares do 8 de Janeiro irá fatalmente se voltar contra a esquerda, a democracia e as lutas populares. A ação contra Carlos Bolsonaro merece aplausos, mas é preciso muito mais

Bolsonaro e Carlos Bolsonaro em Angra dos Reis durante ação da PF; no detalhe, Bolsonaro e os militares.Créditos: Reprodução - Marcos Correa/PR
Escrito en OPINIÃO el

Não é possível vacilar contra o fascismo. Ou os democratas radicais, conhecidos historicamente como esquerda, esmagam a hidra de múltiplas cabeças ou serão esmagados por ela -e junto, a democracia e as lutas populares.

Este é o sentido e o alerta da ação desta segunda-feira (29) contra Carlos Bolsonaro, uma das cabeças da hidra, que comandou as redes sociais fascistas-bolsonaristas ao longo dos últimos anos. Com traços sociopatas evidentes, característica comum dos líderes fascistas ao longo da história, Carlos Bolsonaro foi o chefe do Gabinete do Ódio e, ao que indicam as investigações da PF, um dos articuladores do esquema de espionagem/vigilância da ABIN durante o governo do pai.

Não é possível vacilação nessa luta.

Portanto, a ação contra Carlos Bolsonaro merece todo apoio. É preciso seguir em frente. A condenação de Jair Bolsonaro no TSE e a decretação de sua inelegibilidade foi importante, mas é claramente insuficiente. É preciso alcançá-lo nas 25 investigações em curso contra ele: nos diversos crimes cometidos durante pandemia e no caso da falsificação dos cartões de vacina, decorrência de sua postura na pandemia; igualmente, há que condená-lo como inspirador e articulador do 8 de Janeiro; por seus roubos de patrimônio público nos casos das joias e relógios e outros bens; por ser o grande beneficiário e autorizador das milícias digitais e do projeto de vigilância e espionagem da oposição durante seu governo.

Mas isso é ainda insuficiente. Punir a cúpula civil do fascismo brasileiro é cortar apenas um punhado de cabeças da hidra e deixar a maior parte delas à vontade para novos golpes contra a democracia.

É preciso abrir investigações formais e punir exemplarmente os coronéis e generais fascistas-golpistas, de Mauro Cid a Augusto Heleno, de Paulo Sérgio Nogueira a Luiz Eduardo Ramos e Braga Netto -para começo de conversa. Não punir de maneira exemplar o general Júlio César de Arruda, comandante do Exército nomeado por Lula e que foi peça-chave no 8 de Janeiro, é abrir alas para um novo golpe -para quem não lembra ou não sabe, na condição de comandante do Exército, na noite do 8 de Janeiro, o general Arruda não permitiu o cumprimento de ordem presidencial  para a entrada das tropas da PM de Brasília no Setor Militar Urbano a fim de prender os golpistas lá refugiados depois de expulsos da Esplanada do Ministério. O então comandante do Exército ameaçou um banho de sangue e, segundo o depoimento do então ministro da Justiça, Flávio Dino, deixou no ar a possibilidade de prendê-lo -uma inversão completa na ordem constitucional, pois diante do ato de insubordinação do comandante do Exército deveria ter sido ele alvo de voz de prisão da parte do ministro da Justiça. 

Não é possível vacilar.

Vimos o que a condescendência com os golpistas civis e militares de 1964 custou ao país.

O golpe de 2016.

Vimos o que a condescendência com os golpistas de 2016 -a começar do ex-comandante do Exército Villas Bôas- custou ao país.

A soma das duas condescendências permitiu em 2021-2022 a articulação de um golpe de Estado que, desta vez, por um triz, acabou fracassando em 8 de Janeiro de 2023.

Importante ter em mente que se há agrupamentos de fascistas ideológicos, como o clã Bolsonaro, os setores hegemônicos do agronegócio, a cúpula das Forças Armadas e das Polícias Militares, além das milícias, há vastos segmentos de “fascistas de ocasião”.

São os segmentos da assim chamada direita tradicional -no passado representados partidariamente pelo PSDB e hoje reunidos no Centrão. O Centrão gravita ao redor do financismo, divide a relação com o agronegócio com os fascistas e namora outros segmentos da burguesia. 

O Centrão e suas conexões operam sob a lógica do lucro máximo. Que sistema ou governo permitirá maiores lucros? Se for a democracia, muito que bem. Se for a ditadura/fascismo, não há problema. Essa oscilação permite ao Centrão negociações sempre muito vantajosas. No sistema brasileiro, várias siglas, Progressistas, União Brasil, PSD, MDB, Podemos, e outras compõem este bloco. Em todos eles, pela influência do agronegócio, dos militares, PMs ou milícias, há núcleos fascistas. O PL não é um partido fascista, é originalmente do Centrão mas, neste momento, está “alugado” ao fascismo. 

Portanto, contar com o Centrão é sempre uma operação de risco. Em 1964, os que anteceram Lira et cateva apoiaram o golpe; depois, o golpe contra Dilma; a turma manteve-se à espreita durante o 8 de Janeiro, esperando o lado vencedor para a ele unir-se. 

Os interesses cruzados entre o Centrão e o bolsonarismo/fascismo são múltiplos, todo o tempo. Por isso, a estratégia do governo Lula de apostar suas fichas na aliança com o Centrão para combater o bolsonarismo/fascismo é tão claudicante. Para não melindrar o Centrão, o governo Lula contemporiza com setores políticos ligados ao bolsonarismo, apoia os segmentos econômicos que sustentam tanto Lira quanto Bolsonaro e, sobretudo, não toma qualquer iniciativa para renovar as Forças Armadas e punir os generais golpistas. 

Esperaremos por outro 8 de Janeiro?

Estamos vendo o que a leniência da democracia estadunidense poderá custar ao país: a volta de Trump ao poder. 

A ação da PF desta segunda, por tudo isso, merece ser saudada e apoiada. Mas é preciso ir adiante. 

Sem condescendência nem vacilação.