Rodrigo Abel: O velho discurso do novo

O movimento RenovaBR indica uma repaginação de um dos polos existentes, mais ligado ao extremo oposto à esquerda, o que significa dizer que numa perspectiva de futuro, as elites, como sempre, já estão um passo à frente.

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O movimento RenovaBR indica uma repaginação de um dos polos existentes, mais ligado ao extremo oposto à esquerda, o que significa dizer que numa perspectiva de futuro, as elites, como sempre, já estão um passo à frente. Por Rodrigo Abel* Na semana que passou, foi lançada a plataforma do RenovaBR, uma espécie de “think tank” – laboratório de ideias, que incubou quase uma centena de lideranças políticas, econômicas, regionais e sociais do Brasil, sob o mantra de criar e acelerar uma nova geração de políticos para disputar as eleições proporcionais de 2018. Durante alguns dias me dediquei a tentar compreender com mais profundidade este movimento político, o qual se dividirá a partir de agora – ou não, pela sopa de letrinhas dos partidos políticos existentes no sistema eleitoral brasileiro. O centro das minhas observações parte da afirmação do próprio movimento, publicada em sua página na internet: “O RenovaBR foi criado em outubro de 2017 com o propósito de acelerar novas lideranças políticas e renovar o nosso Congresso Nacional. Somos um projeto criado pela sociedade, para a sociedade. Não somos um partido político e nunca vamos ser. Somos uma grande mesa de centro”. (www.renovabr.org) Ao se propor ser um instrumento político do centro, este movimento nos permite lançar algumas questões para a livre reflexão. O centro político na história recente da democracia liberal – pós-segunda grande guerra, sempre operou em função da díade direita e esquerda, hora pendendo pra um lado, hora pendendo pra outro. Este lugar de desejo, além de ser o “grande” objetivo eleitoral na democracia liberal, também é a residência do censo comum médio da cidadania, uma espécie de ponto “G” do pensamento nacional - quem o seduz é o provável vencedor em qualquer eleição. Este lugar centro, programado para ser o ponto de chegada do movimento RenovaBR, não poderia ser diferente, e nos leva a perceber com certa facilidade a velha triangulação entre as agendas ditas de esquerda e direita, tática usada e reusada pelos democratas e por Dick Morris – estrategista de Bill Clinton, nas eleições norte-americanas e descrita com maestria pelo italiano Noberto Bobbio, em “Direita e Esquerda”, Ed. Unesp, 1994. Esta triangulação fica evidente a partir das discussões entabuladas pelo RenovaBR sobre gênero, direitos sociais, liberdades, meritocracia e gestão de resultados. O constructo deste movimento, assim como sua genética, parte da negação dos extremos – direita e esquerda, e da tentativa de romper somando as linhas divisórias imaginárias que historicamente separaram estes ditos antagônicos. E o faz a partir de um diagnóstico de sociedade e de país que opera no censo comum, afirmando por um lado a inviabilidade do sistema político atual, e por outro, reiterando a ineficiência do Estado em prover seus serviços mais elementares – saúde, educação e segurança. O pano de fundo que organiza e alimenta esse diagnóstico é extremamente tradicional, e se resume ao velho discurso de que tudo é culpa da corrupção e do tamanho do Estado. É desta incompleta reflexão que o movimento RenovaBR se dispõe em construir sua aura e sua identidade de novidade política para enfrentar as eleições de 2018. O que parece estar em jogo nesta perigosa dialética de disputa por uma nova hegemonia de pensamento, é que a negação do velho e a justa luta contra corrupção omitem o lugar de chegada, o centro de tudo: o Estado. Se a hipótese aqui colocada possui algum grau de assertividade, significa dizer que o movimento RenovaBR está propondo construir uma renovação política não desprovida de unidade – forma e conteúdo, tão própria do centro, conforme Norbeto Bobbio expôs em sua obra, mas sim de um novo polo gravitacional, recheado de conteúdo e de estratégia hegemônica. É fato que a conformação de um novo campo político proverá o surgimento de um antagônico, e nisso não há nada de novo na ciência política. Voltaremos, portanto, à velha intrincada teoria de Karl Schmitt, onde a política somente existe na medida em que há um inimigo a ser combatido. O que fica claro é que o movimento RenovaBR indica uma repaginação de um dos polos existentes - mais ligado ao extremo oposto à esquerda, o que significa dizer que numa perspectiva de futuro, as elites -  ainda que haja pessoas ali que não se classificam assim, como sempre, já estão um passo à frente. *Rodrigo Abel é membro da Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia e mestrando em Sociologia e Política pelo IUPERJ Foto: Reprodução