Cenário de Mad Max no interior paulista – Por Adriana Mendes

São muitas as iniciativas que os governantes do mundo todo podem tomar. Mas no caso do Brasil, onde a ideia parece ser acabar com as florestas e dar lugar à monocultura do agronegócio, sabemos que a temperatura só vai esquentar

Imagem: Foco de incêndio em Ribeirão Preto (Adriana Mendes)
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No famigerado feriado do último 7 de setembro viajei para Ribeirão Preto, interior de São Paulo, para ver minha filha mais velha, que só havia encontrado duas vezes depois que começou a pandemia. Também para rever algumas das minhas mais caras e queridas amigas, ficar na casa da afilhada mais maravilhosa que eu poderia ter. Sim, tenho muitas conexões nessa cidade, há mais de três décadas. Começo a acreditar que deve ser algum karma ou dharma.

Saí de Santos no domingo, dia 5, chovia e fazia frio, muita umidade no ar, errei feio a mala, porque há mais de dois anos não viajava para essa região paulista e havia esquecido da secura do lugar. No caminho o tempo já foi mudando, o sol brilhando e, quanto mais nos aproximávamos da região, mais o clima esquentava e surgia uma visão de quase deserto. Árvores queimadas, gado com ossos aparecendo, muita terra e pouco verde. Faltava apenas meia hora para chegar na cidade e avistei uma densa nuvem de fumaça. Era tão densa que a polícia rodoviária fechou a estrada. E assim ficamos esperando por mais de uma hora. Me senti na gravação de Mad Max¹. Uma sensação pós-apocalíptica, uma falta de esperança, desolação.

Na manhã seguinte o nariz sangrava, a fuligem no quintal, o cheiro de queimada. Verifiquei a umidade do ar estava em 8%. Neste dia 6 de setembro, Ribeirão Preto registrou o pior índice de qualidade do ar do Estado de São Paulo, de acordo com a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). Segundo o órgão, o indicador passou de muito ruim para péssimo – o último na escala de medição, resultado da alta concentração de partículas inaláveis finas em circulação.

Foto: Adriana Mendes

Como meu trabalho é remoto, aproveitei a viagem para ficar a semana inteira, ficar mais tempo com as pessoas queridas, naquele calor sempre acima de 35°C. Todos os dias vários focos de incêndio, não só nas lavouras. Por um incêndio próximo à casa de uma amiga, foi necessário evacuar a área. No mesmo dia, mais dois focos, um deles atingiu a distribuidora de energia, o que deixou alguns bairros por mais de 6 horas, sem luz.

Toda a região registra, desde agosto grandes incêndios em áreas de vegetação. No entanto, a situação foi agravada a partir do domingo em que cheguei lá. , quando o fogo atingiu canaviais e mato ao longo da Rodovia Anhanguera (SP-330) em Cravinhos (SP) e em São Simão (SP), distantes 22 e 50 quilômetros de Ribeirão Preto.

As altas temperaturas e a estiagem favorecem as queimadas, e os ventos ajudam a carregar o material particulado fino, que fica suspenso no ar. E tem os que aproveitam para queimar ainda mais o que já está queimando.

No período que estive por lá, dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostraram que, das dez cidades com mais focos de incêndio no Estado, sete são da região de Ribeirão Preto. Foram 72 queimadas, o que representa 58% do total: Guará (26 focos), Jaboticabal (14 focos), Santa Rosa de Viterbo (8 focos), Viradouro (7 focos), Luís Antônio, São Carlos e São Simão (6 focos cada), Américo Brasiliense, Casa Branca: e Serra Azul  (5 focos cada).

Um dia antes da minha partida, fui conhecer uma cachoeira em Cajuru, cidade próxima. O percurso era de queimada, deserto e desolação. Imagine a pior imagem da seca nordestina e talvez seja próximo ao que vi. As árvores do caminho estavam todas queimadas, sem grama verde, nem erva daninha. Nem mesmo a trilha para a cachoeira era respirável, pois não haviam plantas vivas e o ar que entrava pelas minhas narinas era quente, abafado.

Mas as mudanças climáticas, que o governo brasileiro tanto nega, não incluem apenas falta de chuva e calor extremo. São climas extremos. Esse inverno registrou temperatura de 2°C em Ribeirão Preto.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) atualizou suas diretrizes nessa última quarta-feira, dia 22, pela primeira vez desde 2005. A OMS estima que a poluição atmosférica já é responsável por 7 milhões de mortes prematuras anuais no mundo, sendo mais de 300 mil na região das Américas.

Desde 2005 muitas evidências científicas levantadas pelo órgão indicam que os impactos da poluição do ar sobre a saúde humana se tornaram tão graves quanto aqueles associados a problemas como tabagismo e dietas não saudáveis. Por esse motivo, as novas recomendações do órgão sugerem limites mais restritivos para a emissão desses inimigos invisíveis, os chamados poluentes clássicos, que inclui as partículas transportadas pelo ar (PM), dióxido de nitrogênio, ozônio, dióxido de enxofre e o monóxido de carbono.

São muitas as iniciativas que os governantes do mundo todo podem tomar. Mas no caso do Brasil, em que a ideia parece ser acabar com todas as florestas e dar lugar para monocultura do agronegócio, sabemos que a temperatura só vai esquentar. Sabe aquela máxima de que na vida precisamos ter um filho, escrever um livro e plantar uma árvore? Não basta mais uma árvore, cada um de nós deve reflorestar um morro careca inteiro e plantar 100 árvores, se quisermos deixar um ar respirável para o tal filho que se pretenda ter. O livro também pode ser escrito, mas para isso é preciso que se forme leitores, o que também não está fácil nesse Brasil que tem como projeto acabar com a educação.

Mad Max é um filme australiano de ficção científica, de ação e perseguições, produzido em 1979, direção de George Miller, com Mel Gibson no papel do personagem principal.Conta a história de Max "Mad" Rockatansky (Gibson), um policial rodoviário que faz parte de uma força tática, em um ponto remoto da Austrália decadente infestada por uma gangue de perigosos motociclistas.

Teve três sequências:

Mad Max 2: The Road Warrior (1981), Mad Max Beyond Thunderdome (1985) e Mad Max: Fury Road, com Tom Hardy como Max (2015).

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.