CORREÇÃO DE RONCO

Médicos são condenados por não informarem riscos a paciente que morreu em cirurgia; entenda

Decisão do STJ, que determinou pagamento de indenização à família do paciente que morreu, destaca importância da informação clara e precisa sobre riscos em procedimentos cirúrgicos

STJ condena médicos por falta de informações a paciente que morreu em cirurgia.Créditos: Pixabay
Escrito en SAÚDE el

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou, em decisão recente, médicos responsáveis por uma cirurgia de correção de ronco de um paciente que morreu durante o procedimento. Os profissionais de saúde terão que pagar R$ 20 mil em indenização à família do homem que faleceu. 

O motivo é o fato dos médicos - um cirurgião e um anestesista - não terem informado ao paciente os riscos do procedimento cirúrgico. O homem morreu ainda na aplicação da anestesia, mas os ministros do STJ resolveram responsabilizar os profissionais de saúde tendo em vista que o paciente, obeso e com outros problemas de saúde, não recebeu informações claras sobre as dificuldades da cirurgia. 

Segundo o relator do processo, ministro Marco Aurélio Bellizze, "a ação não está fundamentada em erro médico, mas na falta de esclarecimento, por parte dos profissionais, sobre os riscos e eventuais dificuldades do procedimento cirúrgico". Ele pontuou, ainda, que não poderia ser afastada a responsabilidade do médico cirurgião, já que ele indicou a realização do procedimento e escolheu o anestesista.

"Esse dever de informação decorre não só do Código de Ética Médica – que estabelece, em seu artigo 22, ser vedado ao médico 'deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte' –, mas também das regras dispostas na legislação consumerista, destacando-se os artigos 6º, inciso III, e 14 do Código de Defesa do Consumidor", destacou Belizze em seu voto. 

Valor da indenização 

O caso já havia sido julgado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte e, a princípio, o pedido de indenização havia sido julgado improcedente. Depois, a decisão foi reformada e se estabeleceu pagamento indenizatório, por parte dos médicos à família do paciente que morreu, no valor de R$ 50 mil. 

O caso foi parar no STJ e a Corte reformou a sentença novamente, estabelecendo limite à indenização por danos morais a R$ 10 mil para cada um dos dois autores da ação. Isso porque os ministros consideraram que o fato ocorreu em 2002, época em que a prestação de informações de forma clara e precisa aos pacientes não seria habitual.

Segundo o relator, "ao longo dos últimos 30 anos, a medicina vem passando por uma significativa evolução, deixando para trás um modelo 'sacerdotal' em que o doente não participava da discussão sobre o tratamento, e adotando o modelo de 'participação mútua', no qual o paciente atua na tomada de decisão sobre o procedimento sugerido". 

"Hoje em dia é comum se obter o consentimento livre e informado do paciente, inclusive por escrito e mediante informações detalhadas, especialmente no caso de cirurgias. No entanto, não há como ignorar que o fato em discussão no processo aconteceu há mais de 20 anos, época em que não havia, ainda, a prática usual em relação à prestação de informação clara e precisa ao paciente", disse o ministro. 

Termo de consentimento 

Segundo a advogada especializada em bioética Luciana Munhoz, que enviou comentário à Fórum sobre o caso, a decisão do STJ "demonstra que não basta um termo de consentimento genérico (chamado no judiciário de blanket consent), sendo necessário documentos específicos que tragam informações concretas aos pacientes sobre o serviço a ser prestado, por meio de contratos, e o procedimento ao qual o paciente irá se submeter”, destaca.

O "consentimento genérico" também foi destacado pelo ministro relator Marco Aurélio Bellizze no julgamento. Trata-se de "comentários imprecisos ou formulados em termos excessivamente técnicos". 

"A ausência de informações é perniciosa e perigosa nas relações de saúde, devendo a advocacia preventiva ser um apoio ao profissional e às instituições, libertando-os desse risco jurídico de forma eficaz", diz ainda Luciana Munhoz, que elenca três pontos de relevância para os termos de consentimento. 

  • Autonomia: respeita a liberdade de escolha do paciente, traduzindo essa liberdade como autonomia. É a expressão da autodeterminação desse paciente sobre seu tratamento.
  • Relacionamento: Favorece a relação intersubjetiva entre as duas partes, estreitando o vínculo entre profissional de saúde e paciente.
  • Guia o profissional: ao expressar o que deseja ou não no termo de consentimento, o profissional terá condições de entregar um tratamento mais preciso ao paciente, respeitando sua liberdade de escolha.