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Cientistas brasileiros concluem estudo sobre hidroxicloroquina e Covid; veja resultado

O trabalho foi desenvolvido pela Coalizão Covid-19 Brasil, grupo formado por oito instituições de saúde do país, e contou com a participação de 1.372 pacientes

Hidroxicloroquina é alvo de estudo científico.Créditos: Reprodução/Twitter
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O maior e mais completo estudo realizado por cientistas brasileiros sobre a utilização da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19, realizado entre 12 de maio de 2020 e 7 de julho de 2021, concluiu que o medicamento é totalmente ineficaz contra a doença.

O trabalho foi desenvolvido pela Coalizão Covid-19 Brasil, grupo formado por oito instituições de saúde do país: Hospital Alemão Oswaldo Cruz; Hospital Israelita Albert Einstein; HCor; Hospital Sírio-Libanês; Hospital Moinhos de Vento; Beneficência Portuguesa de São Paulo; Brazilian Clinical Research Institute (BCRI); Rede Brasileira de Pesquisa em Terapia Intensiva (BRICNet).

No início da pandemia do coronavírus, em 2020, a hidroxicloroquina ficou conhecida nacionalmente pela insistência do governo de Jair Bolsonaro (PL) em propagar o medicamento como sendo o melhor no tratamento contra a Covid. Na verdade, o remédio é indicado, apenas, para artrite reumatoide, lúpus e malária.

O trabalho foi publicado, no final de março, na renomada revista científica The Lancet Regional Health – Americas.

Foram dois estudos. No Coalizão I, o objetivo foi avaliar se a hidroxicloroquina, sozinha ou associada à azitromicina, poderia ser benéfica para pacientes com Covid-19, com doença que necessitava internação hospitalar”, explica o médico Alexandre Biasi, diretor do Instituto de Pesquisa do Hcor e um dos profissionais que participaram do trabalho.

“No Coalizão V, o objetivo foi avaliar se a hidroxicloroquina poderia reduzir o risco de internação hospitalar em pacientes com Covid-19, com sete dias ou menos de sintomas”, aponta.

Biasi é categórico ao informar o resultado da pesquisa ampla realizada pelo grupo: “Os estudos concluíram que a hidroxicloroquina é ineficaz, seja para pacientes nos primeiros dias de doença, seja para pacientes já hospitalizados”.

As pessoas que foram tratadas com o medicamento nos primeiros dias dos sintomas, inclusive, apresentaram resultados similares aos do grupo controle, que receberam placebo.

Dezenas de profissionais de saúde colaboraram para realizar os estudos. No Coalizão I, participaram 667 pacientes em 55 hospitais. No Coalizão V, participaram 1.372 pacientes em 56 instituições.

O médico Alexandre Biasi - Foto: Divulgação

Uso do medicamento de forma inadequada pode oferecer riscos para a saúde

Além de não ser eficaz para o tratamento da Covid-19, a hidroxicloroquina pode oferecer riscos para a saúde, caso não seja indicada da forma adequada.

“O objetivo principal de ambos os estudos era avaliar a eficácia da hidroxicloroquina, e não houve mesmo sinais de que seja eficaz. No estudo de pacientes hospitalizados (Coalizão I) detectou-se, mais frequentemente, alterações laboratoriais que podem indicar lesão de fígado e alterações no eletrocardiograma, o que significa maior predisposição para arritmias cardíacas. No entanto, o estudo não demonstrou maior risco de problemas relatados por pacientes ou problemas graves”, revela Biasi.

“No estudo de pacientes não hospitalizados (Coalizão V) não houve aumento de eventos adversos. Porém, ambos os estudos não foram desenhados para detectar eventos adversos menos comuns, ou seja, é possível que haja consequências adversas graves em alguns pacientes ao se utilizar a hidroxicloroquina”, acrescenta o médico.

Ele explica qual foi o método utilizado na pesquisa: “Ambos foram estudos randomizados, em que a decisão de se o paciente vai receber a hidroxicloroquina ou não é feita por um processo aleatório (sorteio). Assim, os grupos que recebem hidroxicloroquina e os grupos que não recebem tornam-se muito parecidos. É a forma segura de se definir se um tratamento é ou não é eficaz”, conta.

“No estudo Coalizão I, os pacientes foram alocados em três grupos: um que recebia hidroxicloroquina e azitromicina, um grupo que recebia hidroxicloroquina somente e um grupo controle (que não recebia hidroxicloroquina ou azitromicina). No estudo Coalizão V, os pacientes foram alocados em dois grupos: um que recebia hidroxicloroquina e outro que recebia placebo. Assim, durante o estudo, pacientes e médicos não tinham ciência de qual tratamento, efetivamente, os pacientes estavam recebendo”, destaca.

Cientista destaca importância de pesquisas: “Descartamos mais rapidamente tratamentos ineficazes”

Biasi ressalta que a realização de pesquisas desse tipo é benéfica para todos. “É possível prestar boa assistência aos pacientes e, simultaneamente, gerar conhecimento sólido, via pesquisa, para beneficiar os próximos pacientes. Dessa forma, evoluímos mais rápido. Descartamos mais rapidamente tratamentos ineficazes e oferecemos aos pacientes os tratamentos eficazes. Por isso, merece gratidão da sociedade os pacientes que participaram dos estudos da Coalizão e os médicos que cuidaram desses pacientes”, completa.