DESMATAMENTO

Bolsonaro libera exploração em terras indígenas dois dias após PF cumprir mandado na Funai

Enquanto alto escalão da Funai é investigado por facilitar grilagem em terras indígenas, instrução normativa do governo Bolsonaro permite manejo florestal em áreas demarcadas

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Dois dias após o andar da diretoria de proteção territorial da Fundação Nacional do Índio (Funai) ter sido ocupado por agentes da Policia Federal, que cumpriam mandado de busca e apreensão no combate ao desmatamento e grilagem em terras indígenas, o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) publicou, nesta sexta (16) uma instrução normativa que permite o manejo de floresta por não indígenas "para a exploração de recursos madeireiros em terras indígenas”, conforme o texto oficial, divulgado no Diário Oficial da União.

Publicado pelos presidentes da Funai e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), órgãos vinculados ao Ministério do Meio Ambiente, o documento permite a atuação de organizações indígenas e "organizações de composição mista", o que abre brecha para a atuação de não indígenas em regiões demarcadas, que acumulam casos de violência na disputa por terras, incluindo grilagem e crescimento do desmatamento ilegal. Embora se refira diversas vezes ao Plano de Manejo Florestal Sustentável (PMFS), o texto autoriza, inclusive, o uso de máquinas para o arraste de toras.

Mesmos termos

Na justificativa apresentada na introdução da norma, o texto da Funai e do Ibama diz que “aos indígenas se estende a proteção das leis do País, nos mesmos termos em que se aplicam aos demais brasileiros”. Os órgãos não realizaram consulta às instâncias representativas indígenas e, de acordo com especialistas, desconsidera as formas de gestão que os povos fazem de seus territórios. A demarcação de terras indígenas garante a preservação de extensas áreas de floresta, sendo uma das últimas fronteiras contra a sanha destrutiva do extrativismo ilegal.

Em entrevista ao Estadão, a advogada do Instituto Socioambiental Juliana de Paula Batista afirmou que “essa instrução permite que entidades compostas por brancos possam fazer manejo florestal nas terras. Isso afronta o usufruto exclusivo que os indígenas têm das riquezas dos rios, lagos e solos, previsto na Constituição Federal”. A advogada ainda completou: “o texto também desrespeita o Estatuto do Índio, que proíbe aos não-indígenas a realização de atividades extrativas em terras indígenas. O ato da Funai e do Ibama é absurdo, ilegal, inconstitucional e tenta liberar mais uma boiada no apagar das luzes do governo Bolsonaro”, argumentou.

STF

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que vai levar o caso para o Supremo Tribunal Federal (STF). “Vamos ao STF para derrubar a medida”, disse o parlamentar. Ibama e Funai não se manifestaram.

A publicação ocorre após dois dias da deflagração da Operação Avarus, da Polícia Federal (PF), Ibama e Ministério Público Federal (MPF), que investiga o desmatamento e grilagem na Terra Indígena Ituna-Itatá, em Altamira (PA), com indícios de participação de membros do alto escalão do governo.

Outra informação sobre a relação entre o governo Bolsonaro e o meio ambiente foi divulgada na semana passada, quando foram sistematizados os dados do Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter) de novembro de 2022. A soma das áreas com alerta de desmatamento na Amazônia Legal em novembro deste ano chega a 554 km², representando a segunda pior marca para o mês na série histórica iniciada em 2015, perdendo apenas para o ano de 2019. .