MEDO DA TOALHA?

Censura: Edital de prefeito bolsonarista veta manifestação política em São João de Caruaru

Segundo a convocatória da “Capital do Forró”, no agreste de Pernambuco, "quem não cumprir o estabelecido pode não receber cachê". Censura imposta pode ter a ver com a ida de Bolsonaro ao município

Luísa Sonza com toalha de Lula em show em João PessoaCréditos: Reprodução/Instagram
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Sem a tradicional festa de São João há dois anos por causa da pandemia de covid-19, a comemoração agora acontecerá em ano eleitoral. Porém, o edital da Prefeitura de Caruaru a “Capital do Forró”, no agreste de Pernambuco, veio com uma novidade este ano.  

Além de não serem contratadas pessoas que expressem conteúdo discriminatório — como é de praxe e amparado por lei —, o item 9.3 do edital da prefeitura - comandada por Rodrigo Pinheiro (PSDB) está com um adicional inédito: também não serão contratadas atrações artísticas e culturais que expressem conteúdo “político de qualquer natureza”.

Segundo a convocatória, "quem não cumprir o estabelecido pode não receber cachê". Está no item 10.1.1: “O não cumprimento das exigências, contidas nos Anexo II, III e IV poderá acarretar na rejeição da Prestação de Contas e, consequentemente, o não pagamento da apresentação artística”. 

A grade com a programação dos selecionados começou a ser divulgada ao público na última terça-feira, (17)  e os contratos estão em fase de assinatura. Grande parte dos artistas e produtores ouvidos pelo portal Marco Zero leu a novidade como “censura prévia”. Alguns disseram que a redação da cláusula, na verdade, gerou dúvidas sobre o que realmente a Fundação de Cultura de Caruaru quer estabelecer.

Os artistas que vão tocar na festa preferiram não ter o nome divulgado pela reportagem para não correr o risco de sofrerem sanções. Os trabalhadores da música, de integrantes da equipe técnica aos artistas, sobretudo de grupos menores, dependem dos cachês para sobreviver e muitos estão em situação financeira adversa após quase dois anos sem apresentações presenciais, diante de uma profunda crise financeira e do desmonte das políticas públicas de cultura.

Nas entrevistas, a maioria colocou em evidência que a existência de seus corpos, de seus discursos dentro e fora dos palcos e de sua arte já são por si só expressões políticas, o que deixa explícito o campo no qual transitam e militam. Apesar do descontentamento, também falaram da necessidade neste momento de uma saída que ocupe os espaços públicos de forma estratégica.

 

Presença de Bolsonaro pode ter influenciado na decisão

 

A censura imposta pelo prefeito Rodrigo Pinheiro (PSDB) pode ter uma justificativa oculta: a presença do presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a festa. O próprio prefeito fez o anúncio durante uma entrevista à rádio Cultura do Nordeste. Ele também falou que o presidente deve "prestigiar" o show da banda brucelose, que pertence ao ex-ministro Gilson Machado Neto (PL).
" A notícia que a gente tem é que o presidente Bolsonaro vai vir sim aqui. Os apoiadores deles aqui estão esperando essa visita aqui em Pernambuco e o São João é a maior festa popular , mas todos vão receber convites", anunciou. 

 

O que diz a Fundação de Cultura de Caruaru


A reportagem conversou por telefone com o presidente da Fundação de Cultura de Caruaru, Rubens Júnior, no final da semana passada. Segundo ele, não havia chegado, até então, nenhuma contestação ao edital e os contratos ainda não haviam sido assinados porque a seleção ainda estava em curso. O que o edital do São João 2022 traz é, nas palavras dele, uma “precaução” quanto às contas públicas e uma “recomendação” aos artistas, não uma censura.

Frisando que deseja uma festa de paz e tranquilidade e que o edital recebeu propostas diversas de vários lugares do Brasil, o presidente tentou sair pela tangente ao dizer que “Nós estamos fazendo shows com recursos públicos num ano eleitoral”, diz, citando a possibilidade de uma eventual ação do Ministério Público caso as atitudes dos artistas no palco sejam lidas como infrações à legislação eleitoral ou showmícios. 

“A gente está dizendo que não fale de ninguém. Não estou pedindo para falar do meu e não falar do seu (candidato). Estou sugerindo. Na verdade, o edital sugere que não pode haver manifestação política. Eu estou pagando com dinheiro público.”
“Eu tenho copatrocínio do Governo Federal, do governo estadual e a prefeitura banca a maior parte da festa. São três posições políticas diferentes. Como é que eu resolvo isso? Eu resolvo dizendo assim ‘Olha, não se fala em política, porque o show não é para manifestação individual. O show é para manifestação individual artística".

 

Com informações do portal Marco Zero e Blog Cenário