TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS

Gabriel Boric toma posse como presidente e inicia novo ciclo político no Chile

Oriundo do movimento estudantil, Boric terá de lidar com desafios econômicos e com a extrema direita em ascensão no país

Primeira foto oficial do governo empossado de Gabriel Boric.Créditos: Gabriel Boric/Twitter
Escrito en GLOBAL el

Foi empossado nesta sexta-feira (11) o novo presidente do Chile, Gabriel Boric, que é também o mais jovem da história do país, com 36 anos. 

A chegada de Boric à presidência do Chile está repleta de expectativas, mas também com inúmeros desafios pela frente, principalmente na área econômica. 

Com a posse de Boric, os internautas resgataram um vídeo onde o agora ex-presidente Sabastián  Piñera é interpelado por Boric, à época, líder do movimento estudantil que sacudiu o país. 

Hoje, Piñera e Boric se reencontraram, mas agora para trocarem de lugar: o jovem militante da esquerda chilena assume o comando do país e Piñera retorna à oposição. 

O que esperar do governo de Gabriel Boric?

"A esperança venceu o medo", disse Gabriel Boric em discurso feito logo após ser eleito presidente do Chile, no domingo (19). Boric conseguiu vencer o ultradireitista José Antonio Kast, o "Bolsonaro chileno", com a maior votação já conquistada por um presidente na história do país, 4,6 milhões de votos, e a segunda maior margem percentual desde a redemocratização.

O contundente resultado das urnas não diminui as dificuldades que o presidente eleito terá de enfrentar em um país que vive uma tensa crise social provocada pelo desgaste do modelo neoliberal imposto na ditadura de Augusto Pinochet. Entre os principais desafios estão o enfrentamento das consequência da pandemia de Covid-19, a crise no sistema de aposentadorias, o desemprego de mais de 8% (que ultrapassou os 10 dígitos em 2020) e, é claro, a reforma da Constituição que tem sido conduzida por uma Assembleia Constituinte.

Além disso, o presidente terá uma difícil missão de dialogar com um Congresso bastante dividido, onde a direita tradicional conseguiu manter uma grande bancada, apesar do fracasso do governo de Sebastián Piñera em produzir um sucessor.

Governo marcado pelas lutas sociais dos últimos anos


O presidente eleito fez questão de reforçar que é produto de um processo histórico de lutas, em especial das que tiveram seu início em 2006, contaram com a participação intensa de Boric em 2011 e explodiram em uma enorme hecatombe social em 2019.

“Eu sei que a história não começa conosco. Sinto-me herdeiro de uma longa trajetória histórica, a daqueles que, de diferentes posições, incansavelmente buscaram a justiça social, a expansão da democracia, a defesa dos direitos humanos, a proteção das liberdades. Esta é a minha família ampliada, que gostaria de ver reunida nesta fase que agora iniciamos ”, afirmou o presidente eleito.

Durante a jornada de 2011, Boric era presidente do diretório de estudantes da Universidade do Chile e lutou por educação pública, gratuita e de qualidade. As faíscas desse momento contribuíram para explosão de uma jornada de protestos gigantesca em 2019 contra o neoliberalismo e a herança pinochetista, o que expôs as feridas de um país que foi vítima de uma das ditaduras mais cruéis da América Latina.

Em 25 de outubro de 2019, estima-se que 3 milhões pessoas foram às ruas no país de cerca de 19 milhões de habitantes.

As mobilizações de 2019 provocaram a construção de uma Assembleia Constituinte que vai substituir a Constituição de Pinochet.

 

Gabriel Boric: “Que nunca mais tenhamos um presidente que declare guerra ao seu povo”

Em seu primeiro discurso como presidente eleito do Chile, Gabriel Boric abordou a união, mas também deixou claro que mulheres e a comunidade LGBT, que foram duramente atacados pela campanha do candidato derrotado, José Kast (Republicanos), terão protagonismo em seu governo.

"Quero agradecer com especial ênfase as mulheres da nossa pátria que se organizaram em todo nosso território para defender os direitos que tanto lhes custou alcançar, desde coisas básica como o direito ao voto, que alguns ousaram questionar, até o direito de decidir sobre o seu próprio corpo, do direito a não discriminação pelo tipo de família que decidiram formar, até o reconhecimento pelas tarefas de casa que realizam, quero lhes dizer bem alto: conte conosco, vocês serão protagonistas do nosso governo", declarou Boric.

Após o aceno às mulheres, Boric também discursou sobre o apoio dos movimentos LGBT do Chile, que também se tornaram alvo de ataques da campanha de Kast.

"Vejo as bandeiras aqui… e também quero acenar para os dissidentes e pela diversidade sexual que foram muito discriminados nesta campanha e viram as suas poucas conquistas ameaçadas. Em nosso governo quero que saibam: a não discriminação e a luta contra a violência perpetrada contra a diversidade e mulheres, juntos com as organizações feministas, serão fundamentais", afirmou.


A missão de enterrar "os chicagos boys" de Pinochet

 

Recém-eleito presidente do Chile, Gabriel Boric (Frente Ampla) tem a missão de fazer aprovar o seu plano econômico e, a partir daí, saber se o povo chileno quer, junto com ele, enterrar de vez a herança econômica dos “chicagos boys” do ditador Augusto Pinochet.

O plano econômico de Gabriel Boric e da Frente Ampla trabalha com alguns eixos centrais: taxação das grandes fortunas, a criação de um Banco Nacional de Desenvolvimento, redução da jornada de trabalho, o fim das empresas privadas de saúde e criação de um Sistema Único de Saúde.

A reforma fiscal

A política de reforma fiscal apresentada pelo plano de governo da Frente Ampla também é ousada e, para que o governo obtenha sucesso em sua aprovação será necessária muita pressão das ruas.

O plano fiscal propõe o seguinte:

Um novo esquema com mais royalties de mineração, ou seja, para obter mais recursos do setor mais lucrativo da economia chilena; Reformulação do imposto de renda, que até agora foi diluído pelas fortunas de grandes empresas por não distinguir os lucros das empresas dos lucros pessoais; Retirada de isenções e subsídios a combustíveis e outros setores, como venda de ações, entre outros; Impostos sobre os super-ricos e herança.

O novo governo do Chile, além das reformas estruturais da economia, também pretende criar um Sistema Universal de Saúde, criar um Banco de Desenvolvimento Social e reduzir a jornada de trabalho, estas medidas também prometem causar muitos atritos e pressões externas sobre o presidente eleito Boric.

Aliás, pressão externa que foi dada a Boric assim que foi eleito, o mercado financeiro já deixou bem claro que não gostou de sua eleição: a Bolsa de Santiago caiu 7,45%, a maior queda desde o anúncio da nova Constituinte.

Tudo indica que o governo de Boric, seja no plano econômico ou no social, deve ser marcado por uma tensão constante entre o setor da sociedade que quer romper com o modelo desigual herdado de Pinochet, e entre aqueles que querem construir um Chile mais justo e equânime.