CAETANO VELOSO 80 ANOS

Caetano Veloso, os 80 anos do talento musical que o compositor diz que não tem

O próprio insiste em dizer que não tem, mas o que dizer diante da obra maravilhosa que ele nos entrega há mais de 60 anos?

Caetano Veloso.Créditos: Reprodução de Vídeo
Escrito en OPINIÃO el

Há uma máxima entre críticos e apreciadores mais próximos de que Caetano Veloso é um grande letrista e um compositor e músico limitado. A opinião tem, de certa forma, o suporte do próprio compositor, que vive repetindo que não tem talento musical.

Trata-se, no entanto, com o perdão da expressão, de uma grande bobagem. Vamos por partes. Caetano não tem, de fato, o tal talento musical que cantautores como Gilberto Gil, Djavan e Milton Nascimento têm de sobra. Todos os citados são exímios violonistas, cantores e têm uma grande quantidade de recursos para criar suas canções.

Caetano, no entanto, parte de outro matiz. Sua inventividade e intuição, aliados a uma inteligência rara, são capazes de produzir canções monumentais com uma simplicidade desconcertante.

Vários exemplos

São enormes os exemplos que se distribuem ao longo de sua profícua carreira que já soma seis décadas. A própria “Alegria, Alegria”, que o consagrou definitivamente em 1967, é uma marchinha de poucos acordes, mas que traz passagens inesperadas e inusitadas, construídas a partir de pontes típicas do rock. Tudo é desencadeado por uma letra certeira, que aponta e desvia de incertezas ao longo do caminho.

A genialidade de Caetano na construção de canções prescinde do estudo e domínio da técnica musical propriamente dita. Com poucos elementos, às vezes apenas um acorde, é capaz de construir o trecho de uma das nossas maiores obras. A canção “Terra” tem praticamente em toda a sua primeira parte apenas o acorde de sol maior. Sobre ele, a melodia é toda construída com o emprego de modos – uma escala musical – em que o autor coloca de maneira magistral sua ode ao planeta, feita a partir de uma foto tirada pelos astronautas em sua viagem à lua, que ele viu quando estava preso no quartel do Exército de Marechal Deodoro, no Rio de Janeiro, durante a ditadura militar.

Há inúmeros exemplos de canções de Caetano que comprovam o talento musical que ele diz não ter. Até mesmo algumas feitas com estrutura rica de acordes. Uma delas, “Esse Cara”, é fartamente usada por professores de música para demonstrar uma boa progressão de acordes.

Influência de João

Somado a isso, há o violão tocado delicadamente, mas – o que é mais importante – de maneira única, própria e inventiva. Ninguém toca violão como Caetano Veloso. Seu som é límpido, direto, trata as canções, tantos as suas quanto as de outros compositores, com carinho. Não bastasse isso, sua voz é linda, afinada. Tem uma grande influência de João Gilberto, mas parte dele para uma construção própria.

Poderia citar inúmeras razões que justificam a misteriosa riqueza da música de Caetano Veloso que, no final das contas, ultrapassam todas as barreiras do ponderável. Sua verve é feita de ousadias, coragem desmedida e, sobretudo, beleza, beleza sem fim.

O compositor chega aos 80 anos com sede e inventividade para mais 80 e o que vier. Sua grande obra nos deixa, enfim, uma grande lição sobre o que é ou deixa de ser talento musical, coisa que mesmo sem saber ou sem querer, ele tem de sobra.